Entrevista com João de Jesus Paes Loureiro
Foi morador da CEUP no período de 1963 a 1964, momento em que era estudante da Faculdade de Direito, atuante no movimento estudantil e membro da União Acadêmica Paraense (UAP).
Paes Loureiro é um escritor, poeta e professor universitário brasileiro. Professor de Estética, História da Arte e Cultura Amazônica, na Universidade Federal do Pará. Mestre em Teoria da Literatura e Semiótica, PUC/UNICAMP, São Paulo e Doutor em Sociologia da Cultura pela Sorbonne, Paris, França.
Possui diversas obras publicadas, como o livro "Cultura Amazônica - Uma Poética do Imaginário", tese de doutorado na Universidade de Paris V (Sorbonne, França). Parceiro, como poeta, de vários compositores paraenses, tais como Wilson Dias da Fonseca, é autor da inspirada letra da valsa "Rachelina" (1922), escrita em 1996, cujo texto procura retratar, com fidelidade, o espírito da música composta por José Agostinho da Fonseca (1886-1945), em homenagem à pianista santarena Rachel Peluso.
O Professor doutor e literato João de Jesus Paes Loureiro que morou na CEUP nos anos de 1963 a 1964 e nos contou sobre suas experiências nesse momento de transição. É natural de Abaetetuba, mudou-se para Belém no final da década de 1950 para cursar o ensino secundário. Como não possuía parentes em Belém, morou interno no colégio do Carmo. Mais tarde, ingressou na Faculdade de Direito da UFPA, quando passou a residir com um parente recém-chegado na cidade. Porém, as condições de moradia e localização o fizeram procurar a CEUP, para residir em 1963.
Nisto, as vivências de Paes Loureiro na casa estão ligadas a sua atuação enquanto militante. Seus marcos temporais de memória se referem ao Golpe Militar de 1964 e ao cerceamento das liberdades democráticas, o que para ele levou a um esfacelamento da vida acadêmica e aos significados de luta estudantil, a partir da destruição de símbolos dessa luta. Ele expõe que:
“(...) Falo de um tempo que a UAP era viva e que estava presente de fato na vida acadêmica. Um momento em que a eleição de diretoria da UAP era um acontecimento não só entre os estudantes, mas a sociedade reconhecia também. A casa do Estudante era uma referência no meio acadêmico, e não algo anônimo como foi ficando e é até hoje, um local de hospedagem como qualquer outro. Não! Então todos os signos acadêmicos, e da vida acadêmica, sobretudo foram esvaziados. Como foi muito tempo de esvaziamento, perdeu-se o etos, o vinculo emocional que dava relevo e significação a todos os espaços.”
Seguidamente, o entrevistado comenta acerca do que aconteceu com ele a partir da instauração do Golpe:
“(...) Nesse dia da invasão nós saíamos numa Kombi, para avisar as famílias das pessoas que haviam sido presas ou que fugiram para se esconder. E ao final nós íamos para a Casa do Estudante onde morávamos, lá na Dezesseis de novembro. Quando chegamos na Batista Campos, depois de avisarmos a última pessoa, nós liberamos a Kombi e seguimos a pé. Seguimos pela Conselheiro Furtado para irmos para a Casa do Estudante. Quando estávamos no meio do quarteirão, passou por nós um jipe, com pessoas fardadas e outras não, com paletó. Viram a gente e pararam, nisso cada um correu para o lado. Eu corri pela Apinagés, rumo à casa de amigos, mas no meio do quarteirão, eles tinham dado a volta, me pegaram e me bateram muito. Eu gritei, e como as pessoas saíram a janela para ver, eles param e foram embora.(...)”
Assim como a UAP, a Casa do Estudante Universitário do Pará, residência de Paes Loureiro, também foi invadida. Como órgão ligado a estudantes e que por suas finalidades abrigava estudantes era uma das instituições a ser vigiada pelos militares, como afirma Paes Loureiro ao informar-nos sobre suas ações após ser perseguido pelos militares:
“(...) Eu corri para a casa de uns amigos, não fui mais para Casa do Estudante. Depois fiquei sabendo que ela também foi ocupada. As pessoas tiveram que sair de lá. Mesmo depois da ocupação, quando elas retornaram, a Casa ficou sendo vigiada, porque a maioria das pessoas que moravam lá eram ligadas ao movimento estudantil. Eram lideranças, ou simpatizantes de posicionamento socialista. Então, todo mundo era de esquerda, raramente você via um universitário de direita. Eles eram ou socialista, na maioria, ou comunistas, e ainda da Ação Popular da Igreja Católica. Então eles tiveram que sair da casa, uns voltaram depois, e outros não voltaram, pois era perigoso voltar. Eu não voltei. As minhas coisas que estavam na casa se perderam.”